Luís Rodrigues, presidente da SATA imagem do Telejornal da RTP-Açores
Chegou o dia! Ao contrário de D. Sebastião, o presidente da SATA apareceu. Confirmou as dores anunciadas há um ano, segurou os trabalhadores e disse que não voa se não lhe pagarem. Não é gago, por isso falou assim
SOUTO GONÇALVES TEXTO
Com um estilo muito informal e uma postura sem qualquer tipo de afetação, o presidente do Grupo SATA, há cerca de um ano no cargo, saiu, finalmente, da casca. A sua notoriedade, pelo menos na comunicação social açoriana e até agora, era muito baixa. Isso, a hercúlea tarefa de que foi encarregado e a relação que os açorianos têm com a sua companhia aérea, criaram um certo sebastianismo.
O clima político que se gerou em torno da desastrosa situação da SATA e as interrogações sobre o seu futuro, ou falta dele, que a declaração de Luís Rodrigues na audição parlamentar prévia à tomada de posse agravou — a reestruturação da empresa vai “doer” —, tornaram cada vez mais premente a entrada na cena pública do gestor.
O momento aconteceu em Ponta Delgada perante o presidente do governo regional e os representantes dos partidos políticos com assento parlamentar e, depois, a comunicação social.
Sem gravata, com um colar de identificação da empresa, prometeu, desde que não haja pandemia ou outros contratempos, uma SATA recuperada em 2023, depois de estabilizar as contas em 2022 e de ainda apresentar prejuízos no corrente ano.
As dores, que já não são de parto, mas confirmam o predito, senti-las-ão, por exemplo, os trabalhadores, que embora mantenham o posto, verão o saldo da conta-ordenado crescer mais devagar.
“UM BOM PLANO”
Até 18 de fevereiro o plano de reestruturação da companhia, que será posto em prática entre 2021 e 2025, terá que chegar à Comissão Europeia (CE) e obter o respetivo aval para ficar com pernas para andar.
“Esta é uma proposta do conselho de administração a negociar com a CE num momento de muita dificuldade tendo em conta o histórico e o legado que todos recebemos”, disse o presidente do governo regional enquanto acionista da SATA. Numa nota de esperança confirmou, em resposta a um jornalista, que se trata de “um bom plano”.
Com pinças, como é seu timbre, José Manuel Bolieiro falou de “salvar” a companhia, recusando classificar as medidas previstas como “duras”. Afirmou que são “necessárias” e protegem os trabalhadores.
Sobre o comprometimento do seu governo com as soluções propostas e partindo da confiança que disse merecer-lhe a administração da SATA, Bolieiro prometeu solidariedade “no que diz respeito à equidade da relação entre as exigências das obrigações de serviço público (…) e a respetiva e justa indemnização compensatória”.
“Decisores políticos e regulador” terão que “desenhar a operação de modo a que a companhia não seja penalizada”
O presidente do Conselho de Administração da SATA deixou bem claro até onde pode ir a companhia e o que o acionista terá que fazer para garantir o que está para além de uma operação comercialmente rentável.
Claro que não elaborou sobre o assunto, disse-o da maneira já aqui identificada como sendo a sua índole. “Há uma imposição muito específica da União Europeia: não é possível voar em rotas com prejuízo. Ponto final parágrafo”, atirou.
Luís Rodrigues colocou a batata quente nas mãos dos “decisores políticos e do regulador”. Terão que “desenhar a operação de modo a que a companhia não seja penalizada, ou seja, que não tenha que ser ela a pagar o preço por fazer as operações” que não dão lucro.
SOARAM AS CAMPAÍNHAS
A comunicação social fez eco, entretanto, da reação política ao plano de reestruturação. Os partidos da “posição” mostraram-se satisfeitos e os da oposição… também.
Apenas Rui Martins, do CDS do Faial, levantou a lebre: “A preocupação prende-se com as ‘gateways’ e com as obrigações de serviço público, que é algo que neste momento ainda não está definido”, declarou à RTP-Açores o deputado centrista.
Lembrando que haverá negociações com a República, Rui Martins admitiu “algumas preocupações”, não sobre o plano da SATA, “mas com este pormenor, que poderá afetar aquilo que está previsto para o futuro”.
Talvez porque gato escaldado de água fria tem medo soaram as campaínhas nas “ilhas de baixo”.
Aliando as declarações de Luís Rodrigues a uma notícia do Diário dos Açores que anunciou voos da SATA para Londres, o antigo líder do PS-Açores, apoiante do Grupo do Aeroporto da Horta do Facebook, rede social onde se mantém muito ativo acompanhando a atualidade, questionou “a expansão das rotas internacionais da Azores Airlines, a vigorar em plena crise pandémica, ainda sem fim à vista, enquanto propõe desobrigar-se de servir as ‘gateways’ do Faial, do Pico e de Santa Maria”.
Uma das referências da autonomia política dos Açores, Martins Goulart teve uma reação dura, classificando o plano de reestruturação de “irrealista”, dizendo que a administração da companhia tem a “mania das grandezes”, que “vem de trás” e perguntando se será constituída por “nefelibatas”.
Depois desta tomada de posição, logo pela manhã de hoje, o mesmo Martins Goulart garantiu, ao princípio da tarde, na referida rede social, que “fonte idónea” lhe tinha asseverado que “o Plano de Reestruturação da SATA não incluirá a desactivação das ‘gateways'”.
REVISÃO POR FAZER
Recorde-se que as ligações de Lisboa para a Horta e para o Pico, aeroportos que, com o de Santa Maria, são as denominadas “gateways”, acontecem no âmbito das obrigações de serviço público, destinadas a assegurar o transporte aéreo para destinos cuja inviabilidade económica afasta os transportadores, como será o caso das “gateways” açorianas.
Até 2015, no âmbito dessas obrigações, as companhias eram compensadas financeiramente pelos prejuízos e comprometiam-se a assegurar determinadas condições de transporte, nomeadamente frequência de ligações e valor de tarifas.
Após 2015, com a revisão desta lei, que deveria ter sido novamente revista em 2019, os passageiros passaram a ser ressarcidos de parte do custo das passagens aéreas, com o objetivo de que o transporte de avião fosse incrementado e, por essa via, as companhias de aviação lucrarem, tendo, por isso, deixado de receber a compensação que lhes era atribuída.
Hoje, é aceite que a alteração do modelo não funcionou. |X|
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