Entrega, pelo vereador Eduardo Pereira, da medalha comemorativa dos 100 anos | fotografia de Pedro Rosa
Sobre o Centenário do Sporting da Horta
O Sporting Club da Horta assinalou, na terça-feira, 28 de maio de 2024, o seu 101.º aniversário. Na sessão solene, que decorreu no auditório da Biblioteca João José da Graça, foram entregues medalhas e diplomas a propósito do Centenário do Clube, encerrado naquele momento.
Tive o privilégio de receber a medalha comemorativa do Centenário por ter sido um dos participantes no Fórum «Clubes Centenários – Passado, Presente e Futuro».
Fiquei muito reconhecido por esta deferência dos responsáveis pela organização das comemorações dos primeiros 100 anos do Sporting da Horta. Foi uma honra ter sido alvo de tão generoso gesto.
Aproveito para transcrever alguns textos que fui publicando ao longo do último ano sobre o Sporting, começando pelo do colóquio:
![](https://soutoemlinha.wordpress.com/wp-content/uploads/2024/05/coloquio_clubes_centenarios_2024-04-06_carlos_amaral.jpg?w=656)
Tive o gosto de participar no FÓRUM «CLUBES CENTENÁRIOS – PASSADO, PRESENTE E FUTURO», 6 DE ABRIL DE 2024, 18 HORAS, CASA MANUEL DE ARRIAGA, organizado pelo Sporting Club da Horta.
Usaram da palavra, entre outros, os historiadores Luís Menezes e Carlos Lobão, e eu próprio [na fotografia], que disse o seguinte:
Não se preocupem porque vou falar pouco: são sete folhas, escritas de um só lado, com letras grandes e entrelinha larga, portanto, serei breve.
As comemorações do Centenário do Sporting foram muito bem delineadas e têm proporcionado momentos culturais de grande relevo e importância. Na minha opinião, mostram, de uma forma abrangente e cuidada, o que foi e o que é esta instituição, incontornável, quando se fala de desporto e cultura na nossa ilha.
Parabéns aos organizadores!
Estou agradecido por me darem a oportunidade de participar.
O assunto à minha responsabilidade é maior do que a capacidade que tenho para abordá-lo, o que se torna evidente ao lado de dois historiadores de gabarito. De qualquer maneira, não quis deixar de corresponder ao convite que me foi feito, porque, não sendo eu do Sporting, tenho uma especial consideração por este clube.
Enverguei, por uma época, a camisola do Sporting da Horta. Nessa distante temporada, o Fayal Sport decidiu não formar equipa de voleibol. Bati à porta da sede na Rua Eduardo Bulcão, porque o meu objetivo era praticar desporto, e fui recebido de braços abertos.
«A história da imprensa escrita na ilha do Faial, a importância dos registos no passado, presente e no futuro».
Em vez de considerações sobre a abordagem que me foi proposta sobre este assunto, vou partilhar convosco algumas histórias que eu próprio testemunhei, ou em que participei.
Poderá ser uma achega para o registo da história da imprensa faialense e vai ao encontro do tema.
Porque estamos a comemorar o Centenário de uma coletividade desportiva circunscrever-me-ei à área do desporto.
Os mais velhos que aqui estão, lembram-se, como eu, que, antigamente, havia a equipa de honra ou de 1.ª categoria dos clubes, em oposição às “reservas”, que integravam aqueles que não tinham lugar no onze principal.
Explicando aos que não são desse tempo, posso dizer que, se eu tivesse enveredado pelo futebol, faria parte das “reservas”, de certeza absoluta!
O mesmo já não se pode afirmar dos meus dois colegas de painel, Luís Menezes e Carlos Lobão, que foram dois executantes de primeiríssima categoria do futebol faialense.
Se transportássemos esta realidade para a nossa imprensa, seria caso para dizer que os colaboradores desportivos eram as “reservas” das redações dos jornais.
A informação desportiva teve sempre um certo estigma de inferioridade, as notícias do desporto eram relegadas para espaços menos nobres das publicações.
Foi assim que a minha atividade jornalística começou, fazendo notícias de desporto no Correio da Horta.
Um jovem que aspirasse a escrever no jornal tinha o caminho aberto pela via do desporto.
Talvez uma das razões porque isso acontecia se relacionasse com o facto de, ao noticiário desportivo, estar associada alguma simplicidade: basta dar o resultado de um jogo e está feita a notícia. Mas, isto era se não se entrasse por outros caminhos, pois, nesse caso, a polémica rebentava.
Por isso é que eu digo que o árbitro e o jornalista têm muito em comum: estão ambos do lado da incompreensão.
A informação desportiva, contudo, também funcionava como catapulta do talento de quem tinha a aspiração de ser jornalista. Há casos conhecidos, entre nós, de que já vos vou falar.
Antes, porém, queria deixar vincada uma questão de princípio: apesar do estigma que referi há pouco, jornalismo é jornalismo, seja na área do desporto, da cultura, da política, ou outra qualquer. O problema é que, no plano local, não há, nem pode haver, especialização, e a qualidade, por isso, é mais difícil de alcançar.
A qualidade é difícil de atingir, mas existe, e é por causa de quem escreve, com rigor e qualidade, que há registos da imprensa que são fundamentais como fontes da nossa história.
A este propósito parece-me adequado exemplificar, citando dois ou três nomes.
Um deles está aqui: é o Luís Prieto, galardoado enquanto jornalista. Embora um pouco mais novo do que eu, despertou-me o entusiasmo pela profissão, ainda nos tempos do Liceu, quando foi correspondente no Faial do já extinto jornal desportivo «Offside».
Outra figura relevante é o Luís Rosa. Nunca abraçou a profissão, mas é um jornalista de referência. O seu percurso comprova que a informação desportiva, sendo a tal porta aberta para entrar numa redação, como referi há pouco, também pode ser, igualmente como atrás mencionei, a catapulta de um talento jornalístico.
A crónica do jogo é um género distintivo da imprensa. Entre nós, desapareceu praticamente, mas, tem no Luís Rosa um dos seus mais exímios autores e cultores.
Muitos leitores se lembrarão das suas crónicas de futebol, nas quais, para além de analisar o jogo, fazia apreciações individuais a todos os intervenientes em campo, revelando um apurado conhecimento técnico da modalidade e uma capacidade e argúcia descritivas sem paralelo nas páginas da imprensa local, capazes de ombrearem com o que de melhor era escrito em jornais de nomeada, como «A Bola», por exemplo.
Ainda recentemente, publicou no Facebook duas resenhas históricas a propósito dos centenários do Atlético e do Sporting, detalhando os acontecimentos ano a ano. É uma importantíssima compilação de informação sobre estes dois clubes.
Entra no quadro de honra das figuras destacadas da imprensa, ou da comunicação social faialense, também, o José Lemos, um autêntico fenómeno da rádio.
Vi o Lemos fugir de um microfone como o Diabo foge da Cruz, quando a Antena Nove se formou. Tornou-se, no entanto, no melhor relator desportivo (ou narrador, como agora se diz) da rádio açoriana. Nunca assumiu qualquer função com carácter de profissão; ou seja, atuou sempre como amador, mas é um verdadeiro profissional! Recebeu a sua coroa de glória no dia 30 de maio de 1999, relatando a subida, pela primeira vez, do Santa Clara à 1.ª divisão nacional de futebol, num jogo diante do Desportivo das Aves, no Estádio de São Miguel. Assegurou a transmissão para algumas rádios daquela ilha e respondeu às chamadas, em direto, do consagrado Ribeiro Cristóvão, na emissão nacional da Rádio Renascença.
Pode-se dizer, tal como do Luís Rosa, que ombreia, sem margem para dúvidas, com a fina flor dos repórteres desportivos portugueses. O seu repentismo e permanente sentido de humor, até lhe permitiam, com a mesma paixão que punha no futebol, fazer o relato de um jogo de damas!
Citar nomes publicamente, tem associado um inevitável risco de promover a injustiça, pois há sempre quem merece ser referido e não é. O Luís Prieto, o Luís Rosa e o José Lemos são figuras proeminentes do jornalismo desportivo faialense, o que não quer dizer que não haja outras personalidades que devessem ser trazidas à colação. Além disso, não levei em linha de conta as gerações anteriores à minha. Talvez um dia consiga identificar e dar a conhecer outros nomes que, com brilho, escreveram nos nossos jornais.
Gostava, ainda, de deixar registada a importância que o jornalismo desportivo teve na criação da Rádio do Faial, a Antena Nove.
Já vos disse que comecei no Correio da Horta, tinha 18 anos. A vontade de escrever já existia e foi no desporto que dei asas ao sonho.
No Correio da Horta havia a secção de desporto, designada Correio Desportivo. Convenci um grupo de amigos a juntarem-se à volta de um projeto que transformou essa secção num suplemento do jornal, uma espécie de jornal dentro do próprio jornal.
Nesta altura, década de 80 do século passado, nasceram as rádios locais. Um dia, o Paulo Soares, que era operador de câmara da RTP, perguntou-me se a equipa do Correio Desportivo não queria lançar uma rádio… E lançou! Seis membros da equipa do Correio Desportivo integraram os 10 nomes da cooperativa fundadora da rádio.
Em quase 40 anos de emissões, se a Rádio do Faial tem alguma notoriedade, deve-o, em grande medida, ao seu núcleo desportivo. Esta estação tem falhado em muitos aspectos, mas, a informação desportiva que produz é como um certificado de garantia da sua existência.
Estou a chegar ao fim…
A informação e o jornalismo, atualmente, são fenómenos muito complexos. Mesmo os leitores, ouvintes, espetadores, mais avisados, às vezes, caem como patinhos perante as notícias falsas. Eu que o diga, que já caí muitas vezes.
Se é verdade que uma imagem vale por mil palavras, uma fotografia mal editada, ou enganadora, equivale a mil mentiras.
O hábito prevalecente é ver e não ler. O como e o porquê da informação não importa.
Além disso, qualquer instituição tem o seu próprio “site”, ou uma presença nas redes sociais, e, naturalmente, veicula a informação que lhe convém, ficando a faltar o outro lado da questão. Daqui resulta, olhando para o presente e para o futuro, a importância do jornalismo, que pode ser considerado como a âncora da verdade.
Com o advento dos telemóveis, que hoje já são computadores, todos nós passámos a ser jornalistas. Este fórum ainda não terminou, porém, mas é possível pôr nas redes alguma coisa do que aqui se está a passar. Qualquer pessoa pode fazer isso!
Usando uma frase conhecida, direi que todos somos jornalistas, mas uns são mais jornalistas do que outros.
Digo isto em defesa da classe a que pertenço e com um sentido, propositadamente, discriminatório.
E assim sendo, a talho de foice, deixo no ar a ideia da criação de um portal na Internet sobre o desporto no Faial, com carácter jornalístico: para acompanhar a atualidade, com equidistância e responsabilidade, e guardar informação para a história.
Antigamente era muito difícil lançar um jornal. Apesar de tudo, no Faial, já existiram perto de duas centenas de títulos.
Antes, as principais dificuldades residiam na logística e na despesa da impressão em papel e na distribuição. Com as edições “online” esses problemas desapareceram.
Presentemente, não faltam jovens qualificados nas TIC (Tecnologias de Informação e Comunicação), embora, não tanto no que respeita à qualificação jornalística. Há, no entanto, mercado onde recrutar.
Se se resolvesse a questão financeira, principal condicionante de um empreendimento deste tipo, o desporto seria uma alavanca, entre outras, de afirmação e projeção da nossa ilha, que tanto ambicionamos.
E mais não digo, pois já estou no período de descontos.
Obrigado por me terem escutado. ✓
100 anos do Sporting da Horta: um adversário temível
Já contei — e escrevi — isto várias vezes, mas, como hoje o Sporting Clube da Horta atinge 100 anos, lembrei-me de voltar a fazê-lo, em homenagem à instituição e aos seus associados.
Meu pai, nada ligado ao desporto, era, no entanto, sócio do Sporting. Lembro-me de, numa velha secretária de madeira que ele tinha no seu escritório, encontrar, roído pela traça, o cartão de associado do Clube.
Só me recordo de uma referência que me fez ao Sporting, para contar as peripécias relacionadas com a decoração do polidesportivo da sede da Rua Eduardo Bulcão para o baile do “4th of July”. Ele e mais sportinguistas tinham ido ao mato cortar um grande feto, para colocar no recinto…
Já de meu padrinho (e tio) António Bulcão tenho bem viva a memória do seu sportinguismo. Levava-me ao Campo da Doca, ao domingo à tarde, para ver jogos da sua equipa contra o Atlético e o Fayal. E também me lembro de ir com ele ao Cine-Salão numa tarde em que passava um filme de desenhos animados. Saí de lá em lágrimas porque numa das cenas um homem tentava sentar-se numa cadeira e caía sempre. Mais tarde, também assisti, no mesmo lugar, a um filme em que os protagonistas eram uma criança e um jovem touro… foi o primeiro filme em que me emocionei a valer!
Meu irmão nasceu 20 meses depois de mim. Meu pai levou-me à maternidade no final do ano de 1963 (o nascimento foi a 29). Contente com a chegada de um companheiro (que o foi e é, dos melhores), não deixei de sentir algum ciúme. Minha mãe, para compor as coisas, puxou-me para cima da cama do hospital.
Eu tinha levado um livro de pintar e entretive-me naquilo.
A certa altura, entrou pela porta dentro o Dr. Santos. O Dr. Santos era da Piedade do Pico, freguesia da minha avó materna. Tinha uma especial afeição pela nossa família. Tratou de uma febre tifoide de minha mãe, quando ela era nova, que até ficou sem andar. Sempre que dava a volta à ilha para ver doentes, entrava em nossa casa, em Castelo Branco. E operou-me de urgência à apendicite, não tinha eu ainda quatro anos.
Ao chegar ao quarto onde estavam eu, meu irmão (ainda sem saber que tinha vindo ao mundo), minha mãe e meu pai, o Dr. Santos viu-me a pintar com um lápis vermelho e perguntou, com uma voz que, para mim, na altura, era quase como um trovão: Ó rapaz, de que cor é esse lápis?
— Da cor do Sporting, balbuciei, sem imaginar que tinha dado ao Dr. Santos a maior alegria daquele dia, pois todos sabemos que ele era um sportinguista de gema.
Meu pai, apesar do seu alheamento do desporto, já me tinha incutido um sentimento “encarnado”.
Pouco anos depois, meu primo Zeca Casimiro empenhou-se em me convencer a passar para o Fayal Sport.
Sem saber o que era clubismo, passei-me.
E foi neste clube que pratiquei a minha modalidade desportiva preferida. Tenho recordações extraordinárias do companheirismo da nossa equipa e do exemplo de dirigentes de grande prestígio, como os Senhores João Luís Pereira, João Quadros e José Machado.
Contudo, houve um ano (aí pelos finais da década de 70 do século passado ou princípio da seguinte) em que o Fayal Sport decidiu não fazer equipa de voleibol. Foi aí que toda a equipa se juntou e foi bater à porta do Sporting, pois queríamos, acima de tudo, jogar voleibol.
O Sporting Clube da Horta, que era o nosso principal rival, acolheu-nos da melhor maneira e cumprimos a época, alcançando o objetivo principal que era jogar.
Da equipa de voleibol do Sporting da Horta tenho as melhores recordações — foi um adversário temível, mas a nossa relação desportiva cimentou uma amizade forte com todos os seus jogadores, que até hoje perdura. ✓
[ Texto escrito no Facebook no dia do 100.º aniversário do Sporting da Horta ]
Maior ovação premeia dedicação voluntária ao Sporting
Falecimento de Júlia Cristo
Faleceu Maria Júlia Cristo Dutra.
Júlia Cristo, assim mais conhecida, distinguiu-se como uma singular colaboradora do Sporting Club da Horta, que, aliás, justamente, a homenageou em maio passado, aquando da sessão solene comemorativa do centenário da coletividade.
A dedicação de Júlia Cristo à atividade desportiva, como colaboradora, é um exemplo raro de longevidade, persistência e, sobretudo, de amor a uma causa e a uma instituição.
Oriunda de uma família que, ao longo da história se confunde com a própria história do Sporting, Júlia Cristo empenhou-se, de alma e coração, em tornar o desporto, em geral, uma prática saudável e educativa. O Sporting foi o meio que lhe serviu de instrumento.
Deixa, assim, no campo desportivo, social e cultural da ilha do Faial um legado que, nos tempos que correm, deve ser farol para quantos se dedicam às coletividades e às associações.
As cerimónias fúnebres de Júlia Cristo têm início às 14 horas de hoje na Capela Mortuária da Santa Casa da Misericórdia da Horta. O sepultamento será no Cemitério do Carmo, bem perto da sede social do seu Sporting Club da Horta. ✓
[ Texto lido no programa AQUI HÁ SOUTO da ANTENA NOVE, na quarta-feira, 15 de novembro de 2023 ]
Sede da Rua Eduardo Bulcão está a ser reabilitada
REPORTAGEM DO ANÚNCIO DO PROGRAMA DO CENTENÁRIO →