CAPELINHOS. «Será o estrebuchar da agonia final?»

CAPELINHOS. «Será o estrebuchar da agonia final?»

Diário do Vulcão

O tempo vai passando e o Vulcão dos Capelinhos, um dos maiores acontecimentos da história da ilha do Faial, apesar dos 50, 60 e, agora, 65 anos da erupção, parece que não se afasta. Continua bem presente na vida dos faialenses, através do testemunho real representado pelas suas cinzas acumuladas ao pé do Farol. Embora haja o perigo da erosão fazê-las desaparecer, ficará o Centro de Interpretação como legado para as gerações vindouras não o esquecerem. Hoje, felizmente, a memória do Vulcão é partilhada pelos mais novos, fruto de um conjunto de iniciativas que, com regularidade, vai cimentando um particular afeto que qualquer faialense sente pelo Vulcão. Na passagem do 65.º aniversário do início da erupção do Vulcão dos Capelinhos FAIAL GLOBAL faz o DIÁRIO DO VULCÃO, recordando o que, a partir do dia 27 de setembro de 1957, os dois jornais diários existentes no Faial naquela altura foram dizendo sobre o acontecimento.

SEXTA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 1957 — 8.º DIA, HÁ 65 ANOS

«Parece que o vulcão reuniu todas as suas forças para alardear convincentemente a sua omnipotência. Ou será o estrebuchar da agonia final com convulsões que precedem o fim inevitável de todas as coisas: a morte?»

Depois de descrever, com detalhe, num texto publicado na 1.ª e última páginas, a forma como a erupção vulcânica se estava a comportar, O Telégrafo manifestava, conforme acima citado, a esperança de que tudo pudesse acabar em breve. Era o natural desejo de ver terminada a aflição do povo faialense, que, no entanto, se prolongaria, como se sabe, por muito mais tempo.

Entre o receio de que tudo piorasse ou, pelo contrário, que a evolução do Vulcão permitisse o regresso à normalidade, o Correio da Horta informava que a população parecia «mais calma, tendo voltado algumas famílias às suas casas», não deixando de dar relevo às previsões de José Agostinho, segundo as quais a erupção prenunciava «uma fase efusiva com projecção de fragmentos de lava e não apenas cinzas e escórias».

TODOS OS CAMINHOS IAM DAR AO FAIAL

As notícias da imprensa mostravam que todos os caminhos iam dar ao Faial. Ansiava-se o regresso à ilha do engenheiro Frederico Machado, diretor das Obras Públicas da Horta, cujos conhecimentos e prestígio no campo da sismologia eram reconhecidos. O terceirense José Agostinho, meteorologista de renome e diretor do Serviço Meteorológico dos Açores, já havia falado da importância da presença do engenheiro para observar o Vulcão. O Correio da Horta informou que Frederico Machado se encontrava em Angra do Heroísmo e que chegaria à Horta no dia seguinte, acrescentando O Telégrafo que viajaria no navio Arnel, tal como o meteorologista Soromenho Quintino. Também se dirigia para o Faial uma equipa de reportagem da Emissora Nacional para realizar filmagens, disseram O Telégrafo e o Correio da Horta. Uma missão científica da Direção Geral dos Serviços Geológicos, chefiada pelo engenheiro Orlando Ribeiro, professor da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, que realizara estudos sobre uma erupção vulcânica na ilha do Fogo, em Cabo Verdade, era esperada no sábado, dia 5 de outubro.

O FILME DA ERUPÇÃO

Diariamente os jornais descreviam o comportamento da erupção, ora baseados em relatos de terceiros, ora em observação direta dos seus redatores. «De ontem para hoje, o vulcão dos Capelinhos mantém as mesmas características – erupções mais distanciadas embora muito violentas e demoradas», escrevia, sucintamente, o Correio da Horta.

O Telégrafo alargou-se nalgumas considerações, apesar de o primeiro período do texto ser idêntico ao do vespertino, o que não é de admirar, pois ambos falavam da mesma coisa: «As explosões são agora espaçadas de uma a duas horas, verificando-se então nos períodos de “fúria” erupções bastante fortes. Foi precisamente ontem e contra todas as previsões dos leigos na matéria que o vulcão, após o seu descanso habitual, despertou com uma tal violência até agora nunca verificada. Todas as pessoas são de opinião que durante o dia de ontem – em especial às 8 e 12 horas – a erupção atingiu o auge da força, o que nos leva a concluir que se registaram nessa altura as mais violentas explosões desde o início do fenómeno vulcânico.» Nesta sequência de considerações surge o comentário citado no início deste texto: «Parece que o vulcão reuniu todas as suas forças para alardear convincentemente a sua omnipotência. Ou será o estrebuchar da agonia final com convulsões que precedem o fim inevitável de todas as coisas: a morte?»

«ILHOTA DOS CAPELINHOS»

O Telégrafo disse que a ilhota em formação fora batizada pelo povo de «ilhota dos Capelinhos». O jornal contou que a dita ilhota mantinha a mesma configuração, «com a abertura da cratera para o lado da terra», notando que «a sua periferia» aumentava «constantemente em virtude do contínuo vomitar de lava». As previsões do jornal apontavam para que a ilhota atingisse, na ocasião, 50 metros de altura.

O vento, de sueste, era favorável, «afastando para o mar o perigo das cinzas», que, porém, tinham «caído sobre alguns pontos da ilha de São Jorge».

O Telégrafo informava também que a Foto Jovial e a Jassil, duas empresas com estúdio fotográfico, a primeira das quais se mantém em atividade, estavam a tirar centenas de fotografias, «com sentido de oportunidade e rapidez de serviço» e rapidamente esgotadas devido à procura.

A empresa de transportes coletivos Farias, Lda (que ainda hoje existe) previa realizar viagens para o Capelo, caso houvesse procura, com partida da cidade, no sábado e no domingo, às 10, 13, 16 e 18 horas, anunciava o Correio da Horta, enquanto O Telégrafo dizia que «muitas pessoas de toda a Ilha e ainda bastantes vindas do vizinho Pico» continuavam «a visitar o Capelo».

Por fim o matutino dava uma notícia que desperta curiosidade: «Sabemos que já estão a ser televisionadas as diversas fases do vulcão dos Capelinhos»… na América do Norte!

A notícia não é pormenorizada, por isso fica-se sem perceber de que é que consta o referido televisionamento: de imagens do Vulcão? De fotografias? De gráficos e desenhos? É que, a primeira equipa «cinematográfica», da Emissora Nacional portuguesa, que iria filmar o Vulcão, ainda não chegara, portanto, pergunta-se, onde é que os americanos terão obtido material para televisionar? Será que eram imagens captadas a partir dos voos feitos aos Capelinhos em que participou o tenente-coronel José Agostinho, logo nos primeiros dias da erupção? Se fosse hoje nada disto causaria espanto, mas há 65 anos a informação era muito mais lenta. |X|

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