Recentemente eleito, o presidente desta «verdadeira assembleia política» quer mais coesão na Europa
JÁ NÃO É PRESIDENTE do Governo Regional e, por isso, foi com alguma surpresa que se viu Vasco Cordeiro [na fotografia, com direitos reservados] ascender à Presidência do Comité das Regiões Europeu (CRE). Mas isso só acontece porque, provavelmente, uma larga maioria da população não conhece o funcionamento desta instituição. Estamos habituados a “ver” a representação oficial dos Açores assegurada pelo executivo e por essa razão a pergunta elementar surge óbvia: em que circunstâncias aparece o anterior presidente do Governo neste destacado cargo? Com um propósito pedagógico, escrevi.blog pediu a Vasco Cordeiro uma explicação sobre o assunto. Aqui está, em forma de entrevista:
— Qual é a função do CRE? O Comité das Regiões da União Europeia é, apesar do nome que parece apontar para um órgão administrativo ou burocrático, uma verdadeira assembleia política, composta por cerca de 700 elementos, (cerca de 330 efetivos e 330 suplentes), que provêm dos 27 estados-membro da União Europeia. Sempre que surjam, da parte da Comissão Europeia ou do Conselho, propostas de atos em domínios suscetíveis de ter repercussões ao nível local ou regional: coesão económica, social e territorial, fundos estruturais, Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, Fundo Social Europeu, emprego e assuntos sociais, educação, juventude, formação profissional, cultura e desporto, ambiente, energia e alterações climáticas, transportes, redes transeuropeias e saúde pública, a consulta ao Comité das Regiões, para a emissão de parecer, é obrigatória. Dito de outra forma, o CR tem de ser consultado em todas as fases do processo legislativo da UE e pode recorrer ao Tribunal de Justiça contra legislação da UE, sempre que considerar que os seus direitos institucionais ou dos governos nacionais, regionais e locais tenham sido negligenciados.
— Como se processa a eleição do presidente do CRE? A cada dois anos e meio, num mandato de 5 anos, o Plenário do Comité das Regiões elege o Presidente e o Primeiro-Vice-Presidente.
— Que circunstâncias conduziram à eleição do Dr. Vasco Cordeiro? Desde 2013 que sou membro efetivo do CdR, e, antes disso, entre 2004 e 2008, enquanto Secretário Regional da Presidência do IX Governo Regional, fui membro suplente. Acredito que o trabalho desenvolvido como membro do Comité das Regiões, bem como o desempenho do cargo de Presidente da Conferência das Regiões Periféricas e Marítimas da Europa, entre 2014 e 2020, levaram a que, ainda durante 2019, houvesse um conjunto de representantes de regiões europeias de vários países que tivessem incentivado e manifestado apoio a uma eventual candidatura minha a essa posição. Chegado o momento de apresentação de candidaturas, assim fiz, tendo vencido uma primeira eleição que decorreu dentro do meu grupo político, o PSE. A partir desse momento, tornei-me o candidato do PSE à presidência do Comité. No âmbito de um acordo político entre as duas principais famílias europeias, o PPE e o PSE, ficou acordado que o mandato de 5 anos seria cumprido alternadamente. Isto é, durante a primeira parte do mandato (dois anos e meio) o Presidente seria do PPE e o Primeiro Vice-Presidente do PSE, e durante a segunda parte (restantes dois anos e meio) o Presidente seria do PSE e o Primeiro Vice-Presidente do PPE. Em junho deste ano, realizou-se a eleição desses cargos para a segunda parte do mandato e foi aí que fui eleito.
— Qual é o desígnio da sua Presidência? Em que medida os Açores ganharão com o seu exercício? As prioridades políticas para o meu mandato são três: a primeira pode formular-se como a luta para uma Europa mais forte e mais justa para todos, a segunda como a defesa de uma Política de Coesão que promova e apoie, e a terceira consiste na ideia de elevar o perfil político do Comité das Regiões como uma verdadeira Assembleia política dos poderes locais e regionais da União Europeia. Cada uma delas é declinável num conjunto de considerações que, por falta de espaço disponível, me abstenho de detalhar, mas que podem ser consultadas, em detalhe, no sítio eletrónico do Comité das Regiões. Relativamente à segunda parte da sua questão, julgo que o conhecimento e a experiência que tenho, desde logo, derivados das funções que exerci e exerço, podem ajudar a acautelar, no âmbito da atividade consultiva do Comité das Regiões, os interesses específicos dos Açores.
«Mais do que um Presidente do Comité das Regiões que é dos Açores, prefiro ser um açoriano que é Presidente do Comité das Regiões…»
— Qual o peso político que a Região Autónoma dos Açores tem no CRE? Deseja reforçá-lo? Há um aspeto prévio na resposta a esta questão que para mim é essencial, e que eu gostaria de clarificar: a prerrogativa de representar politicamente a Região Autónoma dos Açores no Comité das Regiões é do atual Governo Regional dos Açores, através dos membros efetivo e suplente que estão presentes nesse órgão europeu. O membro efetivo é o Presidente do Governo e o membro suplente é o Subsecretário Regional da Presidência. São eles que, como representantes do Governo dos Açores, têm a prerrogativa de, não só definir as áreas estratégicas de presença e intervenção no Comité das Regiões, como a forma como essa intervenção ocorrerá. Assim, esse é um dos principais aspetos nos quais assenta o peso político dos Açores no Comité. Da minha parte, em todas as ocasiões propícias à promoção e defesa dos interesses dos Açores, desde logo, como região europeia ultraperiférica, eu estarei, como tenho estado: na linha da frente e pronto a ajudar. No fundo, e como já referi noutras ocasiões, mais do que um Presidente do Comité das Regiões que é dos Açores, prefiro ser um açoriano que é Presidente do Comité das Regiões…
— É possível dar-nos um ou dois exemplos concretos de benefícios, para uma região ultraperiférica como os Açores, que advirão da sua presença no CRE? No âmbito daquela que é a função consultiva do Comité das Regiões, são várias as ocasiões em que, por proposta própria ou por subscrição de propostas de outros membros, caso, por exemplo, de propostas apresentadas pelo Presidente do Governo Regional da Madeira, tenho salientado a importância de atender à realidade das regiões ultraperiféricas. As principais áreas temáticas em que isso acontece são, a título de exemplo, os transportes, a agricultura, as pescas, os fundos comunitários, a situação dos aeroportos regionais e o setor da aviação, o ambiente, entre outras.
— Esta eleição é uma mais-valia no processo que levará o dr. Vasco Cordeiro a ser indicado pelo PS para vir a ser presidente do Governo Regional dos Açores no caso de o seu partido sair vencedor das próximas eleições regionais? Da mesma forma que eu não reneguei a mais-valia que a minha experiência como Deputado Regional, Secretário Regional e Presidente do Governo trouxe no âmbito da minha candidatura, também não enjeito a mais-valia que a experiência, o conhecimento e a rede de contactos adquiridos como Presidente do Comité podem trazer um meu futuro trabalho pela minha terra. |X|