Dia: 9 de Novembro, 2020

De boas intenções está o Inferno cheio!

De boas intenções está o Inferno cheio!

SEG. 9 NOV. 2020 – 23H07 | TEXTO: SOUTO GONÇALVES

NO MEU ENTENDER…

O Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores estabelece, de forma taxativa, o limite de três mandatos consecutivos para o Presidente do Governo e acrescenta que “no caso de apresentação de pedido de demissão, no decurso do (…) terceiro mandato consecutivo, o Presidente do Governo Regional não pode ser nomeado na sequência das eleições imediatas nem nas que se realizem no quadriénio imediatamente subsequente à demissão.”

O Estatuto não diz, no entanto, se, após dois mandatos, um presidente indigitado para um terceiro, que tome posse e não veja aprovado o programa do governo, poderá, em caso de novas eleições entretanto realizadas, ser novamente indigitado.

Se se verificar o chumbo do programa do governo, independentemente da faculdade do Presidente da República de dissolver o parlamento, há ainda a possibilidade de, tendo em conta os resultados eleitorais, o Representante da República fazer nova indigitação, a recair noutro nome.

Porém, se a opção fosse abrir caminho à convocação de novas eleições na sequência da não aprovação do programa do governo apresentado pelo primeiro indigitado, há quem diga que a nomeação decorrente de uma segunda vitória do PS, eventualmente reforçada, não poderia recair sobre a personalidade anteriormente apresentada para tal ao Representante da República, pois a impossibilidade de fazer o terceiro mandato tem origem na tomada de posse e qualquer ocorrência que advenha não poderá retirar validade àquele ato.

Assim sendo, se Vasco Cordeiro tivesse sido indigitado como Presidente do Governo Regional, tomasse posse e, depois, não conseguisse apoio parlamentar para o programa do governo, ficaria impedido de, em caso de novas eleições, concorrer ao cargo.

Então, é lógico que o Presidente do PS-Açores não tenha querido ser indigitado (não apresentou ao Representante da República uma solução governativa para levar ao parlamento) e, consequentemente, tomar posse, porque isso fá-lo-ia correr o risco de não poder apresentar-se de novo para a função, perspetiva que ainda acalentará, apesar de as condições políticas no interior do seu partido não lhe correrem, provavelmente, de feição.

Portanto, todo o arrazoado em torno da alternativa de governo que se gerou não é mais, afinal, do que uma cortina de fumo.

Em suma, o PS (ou Vasco Cordeiro, em particular) não pode, porque não tem apoio no parlamento e, verdadeiramente, não quer tentar formar governo, visto que o objetivo é manter intacta a hipótese de se apresentar em eventuais eleições antecipadas.

Quando se ouve falar de transparência (reclamada como virtude própria e a falta dela como defeito alheio) é sempre bom nos lembrarmos de que de boas intenções está o Inferno cheio! |X|