Por que é que a liderança do PCP não parte, novamente, do Faial?

SEG. 26 OUT. 2020 – 23H44 | TEXTO: SOUTO GONÇALVES

NO MEU ENTENDER…

O PCP (ou a CDU) saiu do parlamento pelos seus próprios pés. Os lamentos que ouço, de comunistas e não comunistas, sobre a lacuna parlamentar que passa a existir, soam-me mal.

Não compreendo que o PCP, sistematicamente, após cada eleição, venha com o choradinho de que “os trabalhadores e o povo”, neste caso açorianos, é que ficaram a perder. Presunção e água benta cada qual toma a que quer.

É uma repisa esta atitude. Porque os comunistas, afinal, estão a criticar aqueles a quem eles próprios foram pedir votos mas que não quiseram dar-lhos. Com liberdade. A mesma que o PCP apregoa.

Para quem andou na clandestinidade, para quem sabe muito de política, aliás faz da política uma profissão, parece-me um fraco argumento este de querer deitar a água fora do capote.

O PCP saiu do parlamento dos Açores por culpa própria. Porque depois da liderança de Aníbal Pires, já para não falar do tempo de José Decq Mota, o PCP nunca mais se encontrou consigo próprio nos Açores.

Teve um coordenador da Direção da Organização da Região Autónoma dos Açores (DORAA) com pedalada, que não desmereceu os seus antecessores. Mas demitiu-se, o que é coisa rara no PCP.

Marco Varela, o coordenador atual, está tapando um buraco. Fá-lo com dignidade, mas não consegue sair dos “clichês” estafados do discurso comunista e não tem perfil para o cargo. Gostei de escutá-lo no debate do Corvo, mas depois não conseguiu manter a performance. Não está em causa, evidentemente, a sua seriedade, empenhamento e espírito de missão.

O que se passou nas Flores nestas eleições é bem a prova de que o PCP-Açores perdeu o pé, embora não tenha perdido a face. Em quatro anos passar de vencedor com 655 votos para sexta força política com 63 diz tudo o que teria que ser dito.

A reflexão, certamente, está ser feita dentro do partido. Urge a ação.

A falta de liderança comunista nos Açores, que persiste há demasiado tempo, constitui a principal responsável pela ausência do PCP do parlamento regional e põe em causa a sobrevivência do partido enquanto referência política respeitável granjeada nos últimos 40 anos.

De um modo geral foram apresentadas nos diversos círculos eleitorais nestas eleições candidaturas muito fracas, que contrastam com nomes prestigiados, com grande capacidade política e intelectual, infelizmente já retirados, como, por exemplo, Mário Abrantes.

Não lamento a ausência do PCP da Assembleia, porque então teria que sentir outras penas.

Neste quadro difícil há, porém, uma exceção, a confirmar a regra: chama-se Paula Decq Mota.

Sem ter tido, ainda, a oportunidade de demonstrar as suas capacidades como deputada, conheço dela o suficiente para afirmar que o Faial incomodaria mais do que já incomoda o poder instituído, seja qual for a nova forma de que se revestir.

Não é por ser minha amiga – apesar da estrutural divergência ideológica que nos afasta – que faço esta ressalva.

Como já lhe escrevi, teria sido boa a sua eleição pelo Faial.

Se tomasse assento na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, órgão que agora confirma, finalmente, a natureza parlamentar do regime autonómico em virtude da composição saída das últimas eleições, Paula Decq Mota levaria, com toda a certeza, a carta a Garcia, no mínimo tão bem como o homónimo destinatário da missiva e certamente melhor do que os apaniguados do regime ora em falência.

Por tudo isto não percebo, como aliás já sugeri, por que é que a liderança do PCP-Açores não parte, novamente, do Faial! |X|

Eleições. Faial continua a ser um bastião social-democrata

MAPA LARANJA CONFIRMADO [FOTOGRAFIA: DIREITOS RESERVADOS]

Enquanto na autarquia da Horta o PS não dá tréguas, já lá vão mais de 30 anos, para o parlamento regional o PSD faialense bate o pé ao poderio socialista

Seg. 26 out. 2020 – 21h56 | Texto: Souto Gonçalves

O PSD reforçou a sua posição no Faial na 12.ª eleição da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA) que ontem decorreu. Há quatro anos os sociais-democratas já tinham recuperado de duas derrotas eleitorais consecutivas neste círculo eleitoral (2008 e 2012), depois de, em 2004, em coligação com o CDS, levarem o PS de vencida por uma unha negra (27 votos) e de em 2000 verem José Decq Mota roubar-lhes um deputado nesta ilha. Antes disso, quando terminou o reinado de Mota Amaral (concluído por Madruga da Costa), em 1996, ocorrera o maior terramoto político dos Açores na era da autonomia político-administrativa, com o advento do império de César, a que o Faial não escapou.

Desde que passou a existir maioria absoluta socialista nos Açores, com exceção do período 2008-2012, ora São Jorge, ora Graciosa, ora Flores, ora Corvo e ora Faial também, têm manchado o mapa cor-de-rosa com outras tonalidades. Mas é a Ilha Azul que persiste em destoar num tom alaranjado.

Andava no ar uma interrogação sobre a resposta dos faialenses ao que era voz comum sobre o estado de desenvolvimento da ilha. E a verdade é que a máxima de Giuseppe Tomasi di Lampedusa “é necessário que alguma coisa mude para que fique tudo na mesma” parece ter aplicação, em parte, à realidade pós-eleitoral.

Ficaram, na mesma, dois deputados para cada lado (PSD e PS), porém, a perda da maioria absoluta à terceira tentativa de Vasco Cordeiro, associada ao refrescamento do espectro [parlamentar] composto pelos partidos mais pequenos, potenciam o latente desejo de mudança no panorama político regional, de que, de facto, o eleitorado faialense se tornou um exemplo paradigmático, com significativo mérito para o partido vencedor da disputa local.

No Faial, aliás, emergiram candidaturas (CDU, CDS, BE…) que, pela sua qualidade, são um bom presságio para a recuperação de uma importância política decadente, que não tem encontrado protagonistas capazes de lhe pôr travão.

É exemplo da falta de uma figura liderante a favor do Faial o poder municipal subserviente aos interesses partidários, que, paradoxalmente, tem recolhido apoio em sucessivas votações.

RESULTADOS ELEITORAIS NO FAIAL (1976-2020)

LEGENDA: PSD, LINHA ESCURA; PS, LINHA CLARA

ANO (1)PSD (2)DIF. (3)PS (2)DIF. (3)DIF. (4)
19765.2872.7252.562
19805.137-1502.580-1452.557
19844.317-8202.055-5252.262
19883.682-6352.940885742
19923.8011193.212272589
19963.211-5903.435223-224
20002.125-1.0862.490-945-365
20042.7856602.75826827
20082.093-6922.421-337-328
20122.6295363.052631-423
20162.695662.133-919562
20202.8931982.1374756
TOTAL40.65531.9388.717

LEGENDA: (1) ANO DA ELEIÇÃO (2) RESULTADO (3) DIFERENÇA DA ELEIÇÃO ANTERIOR DO MESMO PARTIDO (4) DIFERENÇA ENTRE PARTIDOS EM CADA ELEIÇÃO

No Faial o PSD venceu sete eleições para a ALRAA, enquanto o PS ganhou quatro. Em 2004 a vitória pertenceu a uma coligação entre o PSD e o CDS.

Nas 12 legislaturas (período de quatro anos a que corresponde o mandato dos deputados) o círculo eleitoral do Faial repartiu quase sempre os quatro deputados que lhe são atribuídos pelos dois maiores partidos concorrentes, PSD e PS.

A exceção ocorreu no ano 2000, quando o cabeça-de-lista da CDU, José Decq Mota, conseguiu a eleição à custa do PSD, que perdeu um deputado, ficando só com um e o PS com dois.

Nas três primeiras eleições (1976, 1980 e 1984) o PSD obteve três mandatos, contra um do PS. Depois, em 1988, 1992 e 1996, PSD e PS elegeram dois deputados cada qual, embora haja a notar que em 1988 e 1992 o PSD ganhou a eleição, ao passo que o PS venceu em 1996.

Em 2004, em coligação com o CDS, o PSD voltou a ganhar as eleições, elegendo dois deputados, enquanto o PS elegeu os outros dois.

Em 2008 e 2012 inverteram-se as posições quanto à vitória no ato eleitoral, mas a distribuição dos mandatos continuou igual.

Nas últimos dois escrutínios (2016 e 2020) manteve-se a paridade, funcionando, de novo, a alternância entre PS e PSD

É curioso que, no Faial, na, até agora, segunda metade da vigência da autonomia constitucional dos Açores, uma das mais invocadas qualidades da democracia – a alternância – funcionou quase na perfeição, ao contrário do que tem ocorrido a nível regional.

Sintoma da hegemonia política que tende a expressar-se nos Açores é a maior votação de sempre obtida por um partido nesta ilha, embora nunca mais igualada e verificada em 1976: mais de cinco mil votos para o PSD, que atiraram o PS para a segunda posição com menos de metade dos votos.

Nas três primeiras eleições este volume de votos e respetiva porporção entre os dois maiores concorrentes mantiveram-se, mas nos anos seguintes a tendência de equilíbrio entre as duas forças começou a consolidar-se.

De uma diferença entre PS e PSD de 2.562 votos, em 1976, passou-se para 27 somente, em 2004, ambas as vezes a favor dos sociais-democratas.

Há 32 anos e nove eleições nunca nenhum partido conseguiu distanciar-se mais do que 756 votos do outro, número atingido, precisamente, no passado domingo, pelo PSD.

Nas 12 eleições já realizadas para a ALRAA o PSD melhorou a sua própria votação, comparando com o escrutínio anterior, cinco vezes e piorou seis. O PS, ao contrário, logrou uma melhoria seis vezes e perdeu votos em cinco ocasiões.

A maior diferença nesta comparação com resultados da votação precedente pertence ao PSD, no ano 2000, quando caiu 1.086 votos. Nessa mesma eleição o PS perdeu 945 votos, também a sua maior queda. A razão é fácil de encontrar: foi nesta altura que José Decq Mota, da CDU, se elegeu, angariando votos, afinal, onde eles existiam.

Ainda quanto a votos recuperados, nos mesmos termos de comparação, o PSD alcançou a sua melhor performance em 2004, com 660 votos. Também aqui há uma explicação para o fenómeno: a coligação com o CDS.

Em 1988, com uma diferença de 885 votos, o PS bateu o seu recorde de recuperação. Aconteceu quando, pela primeira vez, ultrapassou, de forma clara, a barreira psicológica que o vinha separando do seu adversário de forma quase humilhante. Ficavam, assim, para trás, as votações em que o PS valia sensivelmente metade dos votos do PSD.

A menor recuperação aconteceu agora com o PS, que ganhou quatro votos em relação à sua votação de 2016, altura em que o PSD tinha obtido, em face da eleição de 2012, apenas mais 66 votos, sendo a segunda menor nesta contabilidade em que os partidos procuram superar-se a cada eleição, o que, como se vê, nem sempre conseguem. |x|